“O gato comeu sua língua?” foi uma das perguntas que mais ouvi durante a vida. Em uma família de extrovertidos, ser quieta resultou em deslocamento. Na reunião de pais, os professores diziam que eu era uma ótima aluna, mas precisava falar mais. Os colegas de sala deduziam que eu não conversava com eles porque era metida e não queria me misturar. De alguma forma, o meu silêncio sempre foi malvisto. Cresci acreditando que havia algo de errado comigo.
Nunca ministrei a arte de jogar conversa fora. Reclamar dos preços com o próximo na fila do mercado e fofocar com a manicure são coisas que não fazem parte do meu dia a dia. A verdade é que eu nunca entendi a necessidade que os outros tanto sentem em falar — falar sem parar. O que você tem de tão interessante que todo mundo precisa saber?
Para muitos, falar é uma forma de existir, de se afirmar. E aí entra a ideia de que o mundo é dos extrovertidos: quem fala mais, aparece mais. Quem aparece mais, é notado. E quem é notado… parece mais importante, né?
O problema é que tem muita gente querendo ser ouvida, mas pouca gente querendo ouvir. Porque ouvir dá trabalho. Ouvir exige presença, empatia, tempo — coisas que parecem meio fora de moda hoje em dia. Em vez de ouvir, muitos apenas esperam a sua vez de falar. Às vezes, mal você começa a desabafar e a outra pessoa já está preparando a própria resposta… ou puxando uma história mais trágica, como se fosse uma competição de quem sofre mais.
E nós, os introvertidos, somos mal interpretados. Confundem nosso silêncio com frieza, arrogância ou desinteresse. Mas o que poucos percebem é que somos justamente os que mais sentem, os que mais prestam atenção. Observamos, absorvemos, analisamos. Não precisamos dominar a conversa porque já estamos aprendendo muito só de estar ali.
Certa vez, mencionei que cursava jornalismo e ouvi a seguinte frase: “Mas como você vai ser uma jornalista se fala tão pouco?”. Ser uma jornalista quieta é quase um paradoxo aos olhos de quem acha que a comunicação se mede em decibéis. Mas a verdade é que o silêncio também fala, e, às vezes, ele grita. No meu caso, ele escuta. Escuta com atenção, com sensibilidade, com olhos que acompanham e um caderno que registra não só as palavras ditas, mas também as que foram engolidas. É nesse espaço entre o dito e o não dito que eu construo as minhas histórias.
Acredito que minha não urgência em falar se dá pelas outras maneiras que encontrei para me expressar: fui bailarina por quinze anos, desenhei durante minha vida inteira e mantenho diários desde que aprendi a escrever. Hoje, me derramo aqui. Nesta newsletter, coloco em palavras os pensamentos que rodeiam minha mente, dia e noite, sem descanso. Minha antiga psicóloga me disse que pessoas caladas tendem a pensar demais. E é a mais pura verdade. Às vezes, acho que minha cabeça vai explodir. Aí eu escrevo.
Ser quieto em um mundo que não para de falar é quase um ato de resistência.
Enquanto todo mundo corre para opinar, aparecer, preencher silêncios, quem é quieto observa, sente, escolhe as palavras com cuidado. E isso tem muito valor.
Tem uma beleza enorme em quem sabe estar em silêncio sem estar ausente. Em quem pensa antes de falar, em quem sente o mundo mais por dentro do que por fora. Ser quieto não é falta, é profundidade. E, muitas vezes, é exatamente o que o mundo mais precisa: alguém que não queira dominar o espaço, mas compreendê-lo.
Sendo sincera, há uma força silenciosa nos introvertidos que incomoda muita gente. Porque quem não precisa falar o tempo todo transmite uma segurança diferente. Uma confiança quieta. E isso assusta um pouco quem só se afirma pelo barulho.
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amei o texto mana me identifiquei bastante :)
o silêncio é algo bom que muitos deveriam priorizar, nao que falar seja ruim ms ficar apenas em silêncio observando a vida é tão mais bom que eu nao consigo explicar, as vezes as pessoas dizem pra mim pq estou tão quieta ou ali no meu cantinho quieta observando tudo ms quando vou dizer algo a maioria das pessoas simplimente nao ouvem e apenas descarta minhas palavras, o silêncio se tornou meu melhor amigo desde pequena.
comigo é total o contrário, sempre falei demais e essa era a única reclamação na reunião dos pais, mas com pessoas desconhecidas sempre fui um pouco mais tímida, isso até me soltar. Essa é a frase que mais escuto quando encontro parentes distantes, "o gato comeu sua língua?"
ótimo texto <3